Com uma projeção de 8,09 bilhões em 2025, a população global está, porém, cada vez mais solitária. Tanto que a Organização Mundial da Saúde (OMS) considera o problema uma ameaça à saúde pública. Novos estudos ressaltam que os impactos ultrapassam os devastadores efeitos mentais, com implicações que vão de diabetes ao aumento de risco da mortalidade por doenças cardiovasculares, passando por demência e síndrome da fragilidade no idoso (condição caracterizada por perda de peso e massa muscular).
Pesquisadores da Universidade de Penn State, nos Estados Unidos, descobriram em um estudo com 1.538 participantes entre 35 anos e 65 anos que a solidão de longo prazo está associada a um risco 29% maior de doença cardíaca e de 32% de derrame. A pesquisa se concentrou em adultos jovens e de meia-idade, porque, segundo os autores, geralmente investigações sobre o tema focam em adolescentes ou em idosos. Os dados revelaram que, mesmo quando a falta de conexão social é temporária, há impactos na saúde física, como fadiga geral, náusea e dor de cabeça.
Os participantes do estudo passaram por avaliações do estresse diário e do humor por oito dias consecutivos. Eles deviam relatar situações estressantes ou positivas, incluindo se sentiram solitários e a frequência disso. Também foram questionados sobre sintomas físicos naquele dia, como fadiga ou enxaqueca. As entrevistas foram realizadas duas vezes, com um intervalo de uma década.
Os pesquisadores descobriram que, quando os participantes estavam menos solitários, as queixas físicas eram menores e mais leves. "Essas descobertas sugerem que a dinâmica diária da solidão pode ser crucial para entender e abordar os efeitos da solidão na saúde", afirma David Almeida, professor de desenvolvimento humano e estudos familiares na Penn State e autor sênior do artigo, publicado na revista Health Psychology.
Segundo o pesquisador, aumentar a conexão social mesmo por um dia pode resultar em menos sintomas de saúde. "Esse foco diário oferece uma microintervenção administrável e esperançosa para indivíduos que vivem com solidão."
Com dados de 42 mil adultos entre 40 anos e 69 anos, pesquisadores do Reino Unido e da China encontraram uma relação entre isolamento social/solidão e uma saúde mais precária, além de risco elevado de mortalidade precoce. Os cientistas resolveram investigar possíveis mecanismos biológicos dessa relação e descobriram que pessoas que se consideravam solitárias ou se encaixavam em um perfil de pouco contato com outras tinham níveis mais elevados, no organismo, de substâncias associadas a inflamações, diabetes, doenças cardiovasculares e óbito antes de 75 anos.
Uma das proteínas produzidas em níveis mais altos como resultado da solidão foi a ADM. Pesquisas anteriores apontaram o papel da molécula na resposta ao estresse e na regulação de hormônios sociais, como a ocitocina, capazes de melhorar o humor. A quantidade circulante da ADM foi, agora, associada a um volume menor de uma região cerebral envolvida em processos emocionais e sociais. As taxas maiores também tiveram relação estatística com risco aumentado de mortalidade precoce.
"Essas descobertas reforçam a importância do contato social para nos mantermos bem. Mais e mais pessoas de todas as idades estão relatando sentir-se solitárias. É por isso que para a OMS o isolamento social e a solidão são como uma 'preocupação global de saúde pública'", comenta Barbara Sahakian, professora do Departamento de Psiquiatria da Universidade de Cambridge, no Reino Unido e coautora do estudo, publicado na revista Nature. "Precisamos encontrar maneiras de lidar com esse problema crescente e manter as pessoas conectadas para ajudá-las a permanecerem saudáveis."
Especialista em psiquiatria e integrante do Centro de Álcool e Drogas do Hospital Sírio-Libanês, Arthur Guerra defende que a solidão seja abordada por políticas públicas. Ele lembra que, em 2021, o Japão criou o Ministério da Solidão, um problema que aumenta com a longevidade. "As pessoas vivem por mais tempo, o que, claro, é algo desejável, mas, ao mesmo tempo, acabam se distanciando cada vez mais de familiares, amigos, companheiros e colaboradores", destaca. "Esse é um grande desafio para a saúde pública: lidar com a solidão, um fenômeno que tende a se intensificar em todo o mundo."
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