22 de Fevereiro de 2025

Sob o comando de Galípolo, Copom vai manter aperto monetário


O Banco Central inicia, amanhã, a primeira reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do ano sob o comando do novo presidente da instituição, Gabriel Galípolo. Analistas ouvidos pelo Correio alertam que Galípolo terá vários desafios pela frente, apesar de sete dos nove diretores do BC terem sido indicados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Eles lembram que as incertezas aumentaram com o retorno de Donald Trump à Casa Branca e, no cenário doméstico, a desconfiança em relação ao compromisso do governo petista em conter o ímpeto expansionista da política econômica. As apostas para a taxa básica da economia (Selic) voltaram a subir e se aproximam de 16% para o fim do ano.

Apesar da nova composição do colegiado, o consenso de analistas é de que não haverá surpresa na decisão de quarta-feira, quando sai o anúncio da nova taxa Selic, que deverá passar de 12,25% para 13,25% ao ano. Na avaliação deles, o BC vai seguir a sinalização dada na reunião anterior, de dezembro, quando o Copom acelerou o ritmo de alta da Selic, de 0,50 para 1,00 ponto percentual, e ainda informou outras duas elevações da mesma magnitude.

Com isso, a taxa básica passou de 11,25% para 12,25% ao ano e, até março, deverá chegar aos 14,25% anuais. A grande expectativa ocorre em relação ao comunicado do Copom, pois não há certeza se o BC vai manter fazendo a forward guidance (sinalização futura) para as próximas duas reuniões, como no mês passado.

Especialistas lembram que, na apresentação do Relatório Trimestral de Inflação (RTI), Galípolo mostrou-se alinhado com o antecessor ao afirmar que "a barra estava muito alta" para a alteração do forward guidance da última reunião do Copom. De acordo com eles, outro consenso em formação é a piora das projeções de inflação para o horizonte relevante que mira o Banco Central, ou seja, para os próximos 18 meses.

O ceticismo do mercado contribui para o dólar seguir mais valorizado ante o real ao longo do ano, além de piorar as expectativas em relação à inflação e ao tamanho da taxa Selic, para o BC seguir tentando segurar o custo de vida sem a ajuda do lado das contas públicas. A perna fiscal do tripé macroeconômico, que inclui câmbio flutuante e meta de inflação, segue manca. E, com a perspectiva de mais um ano de estouro do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que mede a inflação oficial, há mais um pilar manco desse tripé estabelecido para dar sustentabilidade à política econômica.

ECO-Copom selic
ECO-Copom selic (foto: Valdo Virgo)

Após o estouro do teto da inflação no ano passado pela 8ª vez desde o início do regime de metas, em 1999, a mediana das estimativas dos economistas do mercado coletadas pelo BC no boletim Focus indica novo descumprimento da meta neste ano. A mediana das previsões do mercado para o IPCA, tanto para 2026, 2027 e 2028 também continua sendo revisada para cima e superior ao centro da meta de inflação perseguida pelo BC, de 3%, com teto de 4,50%.

Logo, as estimativas para a taxa Selic no fim do ano indicam que o Copom deverá continuar aumentando os juros. E, mesmo com a recente queda do dólar, que voltou a ficar abaixo de R$ 6 na semana passada, as perspectivas para o câmbio acima desse patamar seguem firmes para o fim deste ano até 2028, o que exigirá juros mais elevados, especialmente devido às incertezas no setor externo, com o retorno de Trump à Casa Branca. As ameaças do republicano de um tarifaço nas importações podem provocar novas pressões inflacionárias.

Pelas projeções do Itaú Unibanco, por exemplo, a taxa Selic deve encerrar dezembro a 15,75% ao ano. Antes, a previsão era de 15%. E, para o fim de 2026, a instituição elevou a perspectiva para os juros básicos de 13% para 13,75% ao ano.

"O fato é que ainda há muita incerteza, por conta do aumento da expectativa de inflação. A despeito de o BC estar subindo os juros, certamente, ele não vai parar nos 14,25% previstos para março. E, muito provavelmente, a Selic vai terminar o ano entre 15% e 16% ao ano no fim do ciclo de alta dos juros. Mas não dá para descartarmos que é possível que a taxa suba mais do que isso", alerta Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados.

Ele consieera possível o BC fazer um ajuste mais gradual ao longo do primeiro semestre do ano. A queda recente do dólar pode ajudar a reforçar o argumento da autarquia para evitar um choque mais forte na política monetária, uma vez que o consenso do mercado é de que um ajuste fiscal de fôlego só ocorrerá em 2027, ou seja, no próximo governo.

Eduardo Velho, economista-chefe da Equador Investimentos, também alerta sobre a escalada da inflação que, pelas estimativas dele, deverá encerrar 2025 em torno de 6,76%, considerando o dólar em torno de R$ 5,90 no fim do ano, mas com teto de 7,12% — dados acima da mediana das estimativas do mercado coletadas pelo Banco Central do boletim Focus, de 5,08%, no momento. "Para evitar que a inflação fique acima de 6%, a taxa Selic teria que subir para 17% ao ano, e sabemos que o BC não vai fazer isso", explica.

De acordo com Velho, o recuo do dólar nos últimos dias ante o real está vinculado diretamente ao "Efeito Trump", e, a perspectiva de piora do quadro fiscal, uma vez que o pacote de corte de gastos não será suficiente para reverter a trajetória de crescimento da dívida pública, sendo necessárias novas medidas de contenção de gastos.

Na avaliação de Roberto Padovani, economista-chefe do Banco BV, o ritmo de alta da Selic de 100 pontos-base até março já é bastante agressivo para a política monetária do BC brasileiro. "É preciso aguardar a evolução do cenário atual. As decisões das reuniões de janeiro e de março estão dadas, e os membros do Copom vão aguardar mais informações para ver como é que está o comportamento da inflação corrente. As expectativas, é verdade, seguem piorando. Mas acho que eles vão aguardar mais informações antes de mudar o plano de voo traçado", afirma.

Ao ver da economista e professora do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper), Juliana Inhasz, não há dúvidas de que o mandato de Galípolo à frente do BC "não será uma tarefa fácil", principalmente, diante da crescente possibilidade de o IPCA se aproximar mais de 7%, em 2025, e com as revisões para cima da inflação, que seguirá superior ao centro da meta, de 3%, até 2028.

"Galípolo terá muitos desafios para administrar e ainda terá que agradar ao Lula. Por enquanto, ele vai seguir o alinhamento com a antiga presidência, com uma postura mais hawkish (mais dura com a inflação) do que imaginaríamos para mostrar uma postura mais firme no combate ao aumento do custo de vida", afirma. Contudo ela reconhece ainda que o novo presidente do BC vai ter que fazer um certo malabarismo, uma vez que a inflação pode ficar acima do teto neste ano e no ano que vem.

Analistas ainda reconhecem que a alta de 0,11% na prévia da inflação oficial, o IPCA-15, de janeiro acendeu um sinal de alerta devido ao fato de ter ficado acima das estimativas do mercado, que esperava queda do indicador. Rodolfo Margato, economista da XP Investimentos, conta que já elevou de 15% para 15,50% a previsão da taxa Selic para o fim de 2025, e espera alta de 6,1% na inflação deste ano. Ele também recorda que Galípolo reforçou várias vezes que a barra ainda era alta para uma alteração no forward guidance.

"Na nossa visão, não haverá um sinal explícito do BC para além de maio, devido ao fato de alguns drivers de inflação estarem se movimentando em direções contrárias ao período recente, o Copom vai ter que reforçar o tom mais hawkish no comunicado, porque as expectativas de inflação continuam subindo e todos apontam desancoragem em relação à meta, de 3%", afirma ele, que previa deflação de 0,3% no IPCA-15 de janeiro e aponta viés de alta para as projeções do indicador ao longo do ano. "A surpresa no IPCA-15 reforça esse viés de alta e reforça nossa aposta para a Selic chegar a 15,50% ao ano em junho e se manter nesse patamar até o fim do ano", afirma.

O economista da XP reconhece que, no câmbio, apesar de o dólar ter ficado abaixo de R$ 6 nos últimos dias, há pouco espaço para queda ao longo do ano. "Os leilões do Banco Central no mercado de câmbio foram bem fortes diante de 'algumas disfuncionalidades' por conta da demanda maior no fim do ano, mas não achamos que o BC vai utilizar esse instrumento de forma significativa para segurar o dólar. Não é possível carregar meses seguidos de intervenções, porque não acho que exista uma meta de câmbio para o BC", afirma.

Para Inhasz, do Insper, essa primeira reunião do Copom dará o tom do que vai ser a gestão de Galípolo. "Ainda deverá ficar a dúvida de como é que ele vai fazer a condução da política monetária, parte significativa do mercado financeiro ainda não conseguiu fazer esse desenho", frisa.

Na próxima quarta-feira, a decisão do sobre juros do BC brasileiro vai coincidir com a decisão do Federal Reserve (Fed, banco central dos Estados Unidos), a chamada "Super Quarta", e o mercado não espera mudança nos juros norte-americanos, atualmente com intervalo de 4,25% a 4,50% anuais. "O mercado, por ora, só precifica um novo corte de 0,25 ponto percentual em julho", de acordo com relatório da equipe de economistas do banco Santander lideradas pela ex-secretária do Tesouro Nacional Ana Paula Vescovi. Pelas projeções da instituição, a taxa Selic deverá atingir 15,50% ao ano em junho.

O economista Marco Antonio Caruso, do Santander, explica essa projeção. "A piora das condições macroeconômicas dificulta a justificativa de uma redução no ritmo (de alta da Selic), mas o Comitê pode preferir ganhar graus de liberdade dado o aperto das condições financeiras e a potencial atividade mais fraca do segundo trimestre de 2025 em diante. Enquanto isso, não há espaço para o BC hesitar em sua formulação agressiva enquanto as expectativas de inflação estão aumentando", frisa.

Rafael Cardoso, economista-chefe do banco Daycoval, reforça que o BC já se comprometeu com mais uma alta de 100 pontos-base na Selic na decisão do Copom desta semana, mas ele lembra que, desde última reunião, vários fatores que preocupam e que contam para a definição da política monetária pioraram.

"A atividade econômica continua resiliente, ainda que tenha dado algum sinal de enfraquecimento no último trimestre de 2024. Mas sabemos que o agronegócio neste ano vai ter um desempenho bom, que pode contrabalancear a desaceleração. Quando a gente olha o início do governo Trump, que ainda não deixou claro como será a tarifação de importados, existe mais um risco inflacionário no radar", alerta.

 


Fonte: correiobraziliense

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