Apesar de admitir represálias à sua guerra tarifária — lançada no sábado contra Canadá, México e China —, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, afirmou que a dor provocada pelas reações dos países "valerá a pena" e tornou a ameaçar a anexação do Canadá. "Nós pagamos centenas de bilhões de dólares para subsidiar o Canadá. Por que? Não há razão. Não precisamos de nada que eles tenham. Temos energia ilimitada, deveríamos fabricar nossos carros e temos mais madeira do que podemos usar", escreveu, em sua plataforma Truth Social. "Sem esse subsídio massivo, o Canadá deixa de existir como um país viável. É duro, mas verdadeiro. Portanto, o Canadá deve se tornar nosso querido 51º estado."
Dezessete minutos antes, na mesma rede social, o republicano tinha questionado o motivo pelo qual os Estados Unidos deveriam perder "trilhões de dólares" ao "subsidiar" outros países. "Esta será a era dourada dos EUA! Haverá alguma dor? Sim, talvez (e talvez não!). Mas faremos a América grande novamente, e valerá a pena o preço que deveremos pagar. Somos um país que está sendo administrado com senso comum, e o resultado será espetacular!", escreveu.
No sábado (1º/2), Trump impôs tarifas aduaneiras de 25% sobre importações do Canadá e do México, e um adicional de 10% àquelas em vigor sobre produtos chineses. Em resposta, Dominic LeBlanc, ministro das Finanças canadense, anunciou, no mesmo dia, uma tarifação de 25% sobre importações dos EUA — entre eles, frutas e vegetais, laticínios, vestuário, vinho, cerveja e itens domésticos. "O Canadá responderá à ação comercial dos EUA com tarifas de 25% contra US$ 155 bilhões em bens americanos", declarou o primeiro-ministro Justin Trudeau. "Isso inclui tarifas imediatas sobre cerca de US$ 30 bilhões em produtos dos EUA, a partir de terça-feira (4/2)."
Menos de três horas depois da publicação de Trump, Trudeau fez um apelo, no início da tarde deste domingo, aos canadenses. "Agora, é hora de escolher produtos feitos bem aqui, no Canadá. Verifiquem os rótulos. Vamos fazer nossa parte. Sempre que possível, escolham o Canadá", recomendou. O apelo do premiê deu resultado imediato. As prateleiras de supermercados canadenses estampavam uma etiqueta sob alguns produtos: "Produzido no Canadá".
Uma fonte do governo canadense disse à agência de notícias France-Presse que o país apresentará uma queixa à Organização Mundial do Comércio (OMC) contra os Estados Unidos. "O governo canadense considera claramente que essas tarifas alfandegárias constituem uma violação dos compromissos comerciais dos Estados Unidos" no âmbito da OMC e do tratado comercial T-MEC. A China tomou a mesma decisão de acionar a OMC. Trump também ameaça adotar tarifas contra a União Europeia (UE). A Comissão Europeia divulgou nota, em que afirma que "a UE está firmemente convencida de que tarifas baixas promovem o crescimento e a estabilidade econômica, mas responderá com firmeza se tarifas injustas forem aplicadas".
México
A presidente do México, Claudia Sheinbaum, avisou que aguarda a resposta de Trump à proposta de criar uma mesa de trabalho sobre migração e narcotráfico, temas que o republicano citou para impor tarifas ao México. "Sugiro que aguardemos a resposta do presidente Trump a esta proposta (...). Amanhã (segunda-feira), estarei informando as primeiras medidas do que chamamos de 'plano B'" diante desses impostos, declarou, em uma menção à possível taxação de produtos dos Estados Unidos. Trump acusou o México de forjar uma "aliança" com cartéis do narcotráfico e de oferecer-lhes "abrigos seguros".
Vivek Astvansh, especialista em relações comerciais canadense-americanas pela McGill University (em Montreal, Canadá), disse ao Correio acreditar que Trump esteja usando o termo errado em suas declarações. "Subsídio significa que uma parte vende um produto para outro a um preço menor do que o preço de mercado. Não vejo os EUA fazerem isso em relação ao meu país. Esse teatro serve a leigos, que presumem que, se sua nação fabricar um produto internamente, em vez de comprá-lo de outro país, o preço será menor. É uma suposição errada", explicou. Sobre a ameaça de anexar o Canadá e transformá-lo no 51º estado americano, o estudioso afirmou: "Não levo isso a sério".
Ainda segundo Astvansh, os importadores americanos pagarão tarifas aos governos federais. "Os custos aumentarão e os lucros diminuirão. Para tentar conter o declínio dos ganhos, os importadores pedirão aos exportadores mexicanos e canadenses para que reduzam seus preços ou aumentarão os preços para os consumidores finais. "Essa segunda opção ampliará a inflação e pressionará os governos a conterem-na. O governo poderá retirar o aumento da tarifa, sob a alegação de que a nação, agora, está 'segura'. Os exportadores, provavelmente, não poderão reduzir seus preços em até 25%, o que significa que os importadores buscarão exportadores em outros países, assim como exportadores buscarão importadores."
O canadense aposta que a tarifa pode forçar os EUA, o Canadá e o México a forjarem novos acordos comerciais ou aprofundar pactos existentes com outros países. "Isso oferece oportunidades para países da Europa, Ásia, África e América do Sul criarem acordos comerciais proativamente", concluiu Astvansh.
Considerado o "pai das finanças modernas", Eugene F. Fama — professor da Universidade de Chicago e laureado com o Prêmio Nobel de Economia em 2013 — foi sucinto ao comentar a guerra tarifária de Trump. "Meu palpite: tudo isso é uma pose antes de negociações sérias", disse ao Correio, por e-mail.
Em seu editorial da última sexta-feira, o respeitado The Wall Street Journal, de tendência de direita, citou o tarifaço de Trump como "a guerra comercial mais idiota". "Os consumidores americanos sentirão o impacto dos preços mais elevados de alguns produtos", advertiu a publicação
"Os importadores americanos poderão aumentar os preços para o consumidor final, o que aumentará a inflação. O Canadá impôs tarifas retaliatórias. Com isso, os exportadores americanos terão que encontrar países alternativos e reduzir a produção, até que possam encontrar alternativas. Reduzir a produção pode significar demissões."
Vivek Astvansh, especialista em relações comerciais canadense-americanas pela McGill University (em Montreal, Canadá)
Fonte: correiobraziliense
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