Depois de cair por 12 pregões consecutivos — o período mais longo desde o início do Plano Real —, nesta quarta-feira (5), o dólar voltou a registrar alta frente ao real, devido aos ajustes normais e à volta ao radar de problemas internos, principalmente fiscais, segundo especialistas. A divisa norte-americana encerrou o dia cotada a R$ 5,794 para a venda, com valorização de 0,38% sobre a véspera em um dia sem movimentos radicais do novo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.
O economista-chefe da Equatorial Investimentos, Eduardo Velho, considerou que essa nova alta do dólar marca o retorno da percepção do mercado de que o quadro fiscal segue ruim e que a inflação não está acomodada como o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou, ontem, em entrevista para rádios de Minas Gerais. Pelas projeções de Velho, a inflação oficial de 2025 está acima de 6%, diferente dos 5,2% previstos pelo Banco Central. “Nossa previsão central para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 2025 segue em 6,76% ,com limite superior estimado de 7,18%. E, para para 2026, nossa estimativa central seria de 4,77%”, destacou o economista.
Na avaliação de Eduardo Velho, essa reversão no câmbio é natural, porque é caro para os investidores ficarem comprados em dólar. “Há um custo e o investidor precisa apostar em uma valorização acima de 10% para a moeda concorrer com a taxa Selic (taxa básica da economia)”, ressaltou ele, ao prever que os juros básicos, atualmente em 13,25% anuais, devem terminar o ano entre 15,75% e 16% ao ano. “Para evitar uma inflação superior a 6% neste ano, o Banco Central teria que elevar a Selic na faixa de 17% a 17,5% anuais. Mas isso ele não deverá fazer”, acrescentou.
O economista lembrou ainda que o câmbio vinha recuando no meio do recesso parlamentar e, agora, que o Legislativo voltou ao trabalho. “Agora, o mercado financeiro volta a cobrar o ajuste fiscal e vai ficar atento como será o relacionamento político entre o governo e o Congresso, com os novos presidentes das duas Casas”, destacou. Para ele, a volatilidade no câmbio e na Bolsa deverá persistir, pelo menos, até abril, quando o Executivo deve enviar o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2026.
Para Fernando Honorato, economista-chefe do Bradesco, os próximos meses marcarão a “pior combinação entre inflação e atividade dos últimos períodos”. “Os índices de preços ainda responderão à depreciação cambial, à inércia e às surpresas como crescimento, manifestamente nos núcleos. No entanto, os sinais de desaceleração da economia vêm se acumulando, nos fazendo ganhar convicção no quadro de recessão na segunda metade do ano”, escreveu ele, que reduziu de 2,2% para 1,9% a previsão de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) deste ano, mas manteve em R$ 6 a previsão para o dólar no fim de dezembro.
Ajuste normal
Gustavo Cruz, estrategista-chefe da RB Investimentos, enxergou a volta da desvalorização do real ante ao dólar ontem como um movimento de ajuste normal do mercado. “Muitas pessoas devem ter visto o dólar caindo ao longo dos últimos dias e aproveitou para comprar. Mas isso vai se esgotando um pouco para dar mais uma pernada e, talvez a gente precise de mais algum fato novo ou de um movimento um pouco mais forte no mercado externo para que o dólar volte a cair novamente”, destacou.
“Apesar da forte convicção de que a atual taxa de câmbio se provará depreciada, caso se afaste o quadro de dominância fiscal, decidimos manter a premissa de uma moeda estável em R$/US$ 6,00 até o fim do próximo ano”, acrescentou ele.
“O dólar quebrou uma sequência de 12 quedas para fechar em leve alta nesta quarta-feira, numa ‘correção’ técnica moderada, pois ainda acumula perda de 4,83% neste período e baixa de 6,6% no ano”, comentou o economista Julio Hegedus Netto, da JHN Consulting. Na avaliação dele, a produção industrial mais fraca no Brasil, o alívio na retórica de Trump sobre a guerra tarifária e os dados de emprego nos EUA em janeiro acima do esperado ajudaram nessa inversão do sinal da divisa norte-americana.
Além de minimizar a questão da inflação, Lula ainda afirmou que pretende taxar os produtos dos Estados Unidos se Trump taxar os produtos do Brasil: “É lógico. É o mínimo de decência um governo utilizar a reciprocidade”, afirmou o chefe do Executivo na entrevista às rádios mineiras ontem. Na véspera, a China formalizou queixa contra os Estados Unidos na Organização Mundial do Comércio (OMC) sobre as tarifas de 10% anunciadas por Trump, no fim de semana. Segundo comunicado da OMC, o país asiático alega que as medidas tarifárias dos norte-americanos violam as obrigações em relação ao status de nação mais favorecida, com base nas normas da entidade de comércio global. Além disso, o país asiático revidou com uma taxação de 10% a 15% sobre vários produtos norte -americanos.
Enquanto isso, a Bolsa de Valores de São Paulo (B3) fechou o dia em alta após recuar por três dias seguidos, acompanhando as bolsas internacionais que operaram no azul. O Índice Bovespa (IBovespa), principal indicador da B3, registrou valorização de 0,31%, para 125.534 pontos, acumulando, no ano, avanço de 4,37%.
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