22 de Fevereiro de 2025

O novo analgésico usado como arma contra crise de opioides


Nos Estados Unidos, dizem que é uma epidemia — e causa dezenas de milhares de mortes que poderiam ser evitadas a cada ano.

As mortes por overdose de analgésicos opioides provocaram mais de 80 mil mortes no país em 2022, segundo dados dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC, na sigla em inglês).

Uma das principais causas deste problema é que estes medicamentos são muito eficazes no combate à dor, o que significa que são receitados com relativa frequência, apesar de — ao mesmo tempo — terem um alto potencial de gerar dependência.

Um novo remédio para o tratamento da dor aguda, aprovado recentemente pelo FDA, órgão regulador de medicamentos nos EUA, promete se tornar um instrumento importante na luta contra a crise dos opioides.

O medicamento, chamado suzetrigina, vai ser comercializado nos EUA como Journavx. Fabricado pela Vertex Pharmaceuticals, ele faz parte de um novo tipo de analgésico que modula o sinal de dor no local da emissão, em vez de nos receptores do cérebro, como fazem os opioides.

Isso, dizem os especialistas, eliminaria o risco de dependência e vício associado ao uso de opioides, especialmente em situações de dor aguda, como cirurgias ou acidentes.

"A aprovação é um marco importante no tratamento da dor aguda", afirmou Jacqueline Corrigan-Curay, diretora responsável pelo Centro de Avaliação e Pesquisa de Medicamentos do FDA.

"Uma nova classe de terapia analgésica não opioide oferece a oportunidade de mitigar certos riscos associados ao uso de opioides para a dor, e oferece outra opção para os pacientes."

A aprovação é a primeira em mais de 20 anos para um novo tipo de analgésico, o que evidencia as dificuldades que os cientistas enfrentam no tratamento da dor.

No Brasil, os opioides já circulam no mercado paralelo ilegal — fora das mãos de pacientes com prescrições adequadas e do ambiente hospitalar.

Em 2019, uma pesquisa feita pela Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) mostrou que 4,4 milhões de brasileiros já utilizaram opioides sem prescrição médica.

Isso acende um alerta para que as autoridades ajam preventivamente, impedindo a popularização do uso indevido desses medicamentos e evitando um cenário semelhante ao vivenciado nos Estados Unidos.

Nos últimos 30 anos, Stephen Waxman, da Universidade de Yale, nos EUA, vem pesquisando os mecanismos que o corpo usa para expressar a dor.

Seus estudos se concentraram principalmente nos nervos do sistema periférico —aqueles que comunicam órgãos e membros ao sistema nervoso central e, depois, ao cérebro — e nas moléculas químicas que eles usam para comunicar sinais de dor ao cérebro.

"Os opioides funcionam como uma chave e uma fechadura dentro do cérebro", impedindo a chegada destes sinais, explicou Waxman à BBC News Mundo, serviço de notícias em espanhol da BBC.

"O cálice sagrado da pesquisa sobre a dor era encontrar as moléculas em nossos nervos periféricos e poder bloquear esses sinais."

Com sua equipe de Yale, Waxman fez experiências com diferentes compostos para bloquear uma molécula conhecida como NAV 1.8, uma espécie de bateria que permite aos nervos enviar sinais de dor para o cérebro.

Ao se concentrar na emissão do sinal, em vez de na recepção no cérebro, muitos dos efeitos colaterais associados aos opioides são evitados.

"Não toca o cérebro, por isso não tem os efeitos colaterais como sonolência, confusão, visão dupla ou perda de equilíbrio, e não tem potencial de dependência. Portanto, é realmente um grande avanço", diz o especialista, que não trabalha para a Vertex, mas é consultor de empresas que estão desenvolvendo medicamentos semelhantes.

Embora a aprovação do FDA tenha sido para o tratamento da dor aguda, Waxman explicou que ainda não se sabe se esses medicamentos podem tratar a dor crônica ou certas dores específicas para as quais existem poucos tratamentos.

Embora o processo de aprovação de qualquer medicamento, desde os estágios de pesquisa até o lançamento no mercado, possa levar de 15 a 20 anos, a dor é uma área particularmente difícil de ser estudada.

"Acho que os desafios associados ao desenvolvimento de um medicamento para a dor são maiores do que os associados ao desenvolvimento de uma vacina ou de um medicamento para doenças inflamatórias ou câncer", diz Waxman.

"É possível medir essas doenças, fazer um exame de sangue e procurar biomarcadores — evidência molecular da presença de alguma doença no corpo. A dor é uma resposta subjetiva", acrescenta.

O especialista explica que medir a dor, por meio de questionários em que o paciente é solicitado a definir a intensidade em uma escala de um a dez, pode levar a resultados irregulares, uma vez que outros fatores, como sono ou ansiedade, podem aumentar a percepção da dor.

É por isso que Waxman vê a recente aprovação da suzetrigina como um marco que ele espera que abra portas para novas formas de combater a dor.

"O trabalho está engatinhando. Só veremos seu amadurecimento daqui a 10 ou 15 anos, mas eu realmente acredito que teremos terapias para a dor personalizadas e individualizadas, baseadas no genoma, em algum momento nos próximos 10 ou 15 anos."

A chegada da suzetrigina, e dos medicamentos que podem surgir após sua aprovação nos EUA, também pode ser um mecanismo para reduzir a exposição de pessoas saudáveis ??a opioides em situações médicas.

Isso se deve ao seu imenso potencial de dependência: de acordo com dados do Hospital Geral de Massachusetts, de 9% a 13% dos pacientes que usam analgésicos opioides após uma cirurgia acabam fazendo uso crônico.

É um número alarmante, considerando que, somente entre setembro de 2023 e agosto de 2024, os EUA registraram quase 58 mil mortes por overdose de opioides, apesar dos imensos recursos e programas para reduzir o impacto deste tipo de substância nas comunidades.

Como parte da sua política de governo, o presidente americano, Donald Trump, tem usado a imposição de tarifas como instrumento para pressionar a China, o México e o Canadá a aumentar seus esforços para impedir a entrada do fentanil, opioide sintético, nos EUA.

Mas os especialistas concordam que novos tipos de medicamentos, como a suzetrigina, devem fazer parte de uma estratégia de longo prazo para evitar que pacientes saudáveis entrem em um mundo do qual dificilmente conseguem sair.

"O FDA apoia há muito tempo o desenvolvimento de tratamentos não-opioides para a dor", declarou a agência reguladora em comunicado.

"Como parte da Estrutura de Prevenção de Overdose do FDA, a agência emitiu um projeto de orientação com o objetivo de incentivar o desenvolvimento de analgésicos não-opioides para dor aguda, e concedeu subsídios para apoiar o desenvolvimento e a disseminação de diretrizes de prática clínica para o gerenciamento de condições de dor aguda", acrescentou.

Fonte: correiobraziliense

Participe do nosso grupo no whatsapp clicando nesse link

Participe do nosso canal no telegram clicando nesse link

Assine nossa newsletter
Publicidade - OTZAds
Whats

Utilizamos cookies próprios e de terceiros para o correto funcionamento e visualização do site pelo utilizador, bem como para a recolha de estatísticas sobre a sua utilização.