Candidata à vice-presidência na chapa de Ciro Gomes (PDT), a ex-vice-prefeita de Salvador Ana Paula Matos vê a educação como prioridade no Brasil e a principal ferramenta no combate à pobreza. A advogada e professora também defende uma reformulação do Pacto Federativo, a fim de estabelecer novos critérios para o repasse de recursos entre União, Estados e municípios. Ela também defendeu a postura de seu correligionário nos ataques ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). “Ciro apenas falou verdade”, resume. O site da Jovem Pan convidou, via assessoria de imprensa, os candidatos a vice-presidente das quatro chapas mais bem colocadas nas pesquisas de intenção de voto do Datafolha. O ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin (PSB) e o general Walter Braga Netto (PL) não deram resposta dentro do prazo estabelecido pela reportagem. A pedetista abre a série de publicações. Confira abaixo os principais trechos da entrevista:
Pouco antes do impeachment de Dilma Rousseff, Michel Temer divulgou a célebre carta na qual dizia se sentir um “vice decorativo”. No governo Bolsonaro, Hamilton Mourão foi escanteado e desautorizado algumas vezes pelo presidente Jair Bolsonaro. Se eleitos, qual será o papel da senhora como vice de Ciro? Tenho total afinidade com o Ciro. Meu papel é de gerir junto. Temos feito isso desde a campanha. Ele me deu a honra de coordenar o plano de governo. Tenho trazido muito olhar social, casando essa questão do desenvolvimento econômico com o social. Se ele precisar ficar muito em Brasília, estarei nos Estados representando [o governo]. Se ele estiver nos Estados, estarei em Brasília. Temos características de sermos pessoas questionadoras, que buscam estudar e ao mesmo tempo realizar. Vamos trabalhar juntos. A grande questão que nos move é o amor pelo Brasil. O país precisa estar em um novo patamar de desenvolvimento e de cuidado social. Temos clareza disso e vamos trabalhar juntos. O Brasil precisa de união, de paz e crescimento.
A senhora terá alguma área específica de atuação? Nossa principal característica é essa afinidade programática. Quer dizer que não estarei isolada em um aspecto do governo. Estarei com ele, pensando e coordenando o governo. Isso fica muito claro quando ele me convida para elaborar as diretrizes do plano de governo, que são as diretrizes de como será a gestão. Sou especialista no combate à pobreza. É uma área que me move. Não preciso estar na execução, mas estarei sempre pensando nas políticas e ajudando mesmo a implementar. Estamos aqui pelo Brasil e não por um projeto pessoal. Não tenho a ideia de ficar focada em uma área, mas exercer o papel de protagonismo que as mulheres precisam ter.
Se Ciro Gomes for eleito, qual será a prioridade número um do governo? A educação. Entendemos que a educação é a política mais efetiva de combate à pobreza. Junto com a educação construímos a autonomia das pessoas, gerando perspectiva de emprego e de renda. Quando você se propõe a governar um país, precisa entender que existe política de curto, médio e longo prazo. Curto prazo é matar a fome. É tirar o Brasil do mapa da fome e da pobreza. É entrar com nosso programa com renda digna, que tem um aspecto da transferência, com renda mínima de R$ 1 mil, mas que tenha a geração de empregos, de 5 milhões de empregos de forma imediata. Pensar sempre no salário mínimo acima da inflação. E fazemos isso com desenvolvimento econômico, fortalecendo a indústria, buscando a geração de empregos e dando dignidade às pessoas. Pensamos em fazer isso de modo sustentável. Em algo que se transforme em melhorias na vida das pessoas tem que ser pela educação. Agora, o imediato é acabar com a fome, tirar o Brasil da pobreza com renda digna e geração de empregos. É o desenvolvimento econômico e social caminhando juntos.
O governo Bolsonaro trocou os ministros da Educação constantemente. O ministro Milton Ribeiro, inclusive, foi preso após deixar a pasta, suspeito de envolvimento com esquema de desvio de verbas. Diante desse cenário, em que não houve continuidade para desenvolver políticas públicas, o que fazer para transformar a educação naquilo que o brasileiro espera? Estamos nos preparando há muito tempo. Estamos prontos para fazer a transição e saber quais são as perguntas certas. Entender de fato onde estão os problemas, qual o investimento real, acessar as pessoas para, no dia 1º de janeiro de 2023, começar a fazer essa gestão adequada. Compreendemos que na educação precisamos fazer o investimento correto. Gastar menos nas máquinas, mas investir mais nas pessoas. Para isso, preciso entender que o Brasil é plural e entender se nesse Estado ou cidade há a necessidade de universalizar a educação, se existem crianças fora da escola ou pessoas sem acesso à educação. Esse é o primeiro ponto para garantir esse acesso para todos e depois a individualização. Entender que em uma cidade pode sobrar vaga em uma creche ou escola e faltar em outro bairro. A mãe, muitas vezes, não tem condição de fazer essa transição. Às vezes, existe uma distorção muito grande na idade do aluno com a série onde ele está, além de muita evasão escolar. [É importante] Ter professores preparados para uma questão social e familiar. Tenho que ter programas onde vou até a família, entendo a realidade e trago essa família para próximo, diminuindo essa evasão escolar com política e planejamento. Preciso fazer também uma nova metodologia de ensino. Tenho que ter uma lógica de ter informatização e uma pedagogia adequada ao mesmo tempo. Temos profissionais qualificados, mas como fazer que isso não seja da característica de um professor, mas que seja da lógica de um sistema educacional? Tenho que pensar no ensino médio profissionalizante, onde o aluno precisa ter acesso ao estágio e tenha perspectiva de crescimento. A realidade dele pode ser transformada nisso. Para isso, precisamos ter um novo Pacto Federativo, onde o governo federal tenha perspectiva de investir e gerar as diretrizes e possa estar de mãos dadas com os governos estaduais e municipais. Isso será feito com investimento e prioridade absoluta na educação.
A facilidade de acesso às armas foi uma das principais marcas do atual governo. Recentemente, o Exército admitiu que não sabe qual é o tamanho do arsenal dos CACs em cada cidade. No governo Ciro Gomes, o que será feito com esse acesso desenfreado às armas? Ana Paula: Não posso tratar isso de um modo simplista e sim com a complexidade que ela merece. Não é porque existe ou não um determinado elemento, que terá maior ou menor segurança. Passa pelas pessoas se sentirem parte da sociedade. Dessa criança, jovem e adulto entender que bem formado e educado terá oportunidade no mercado de trabalho. Entender que onde ela mora, tem um ambiente saudável e familiar onde ele possa receber a visita de um amigo e um parente. E não que ele tenha dificuldade de se alimentar por conta de um mau-cheiro de um esgoto a céu aberto. Porque ele não sabe se terá o que comer ou onde dormir e se terá o dinheiro para dar o alimento a sua família. Para falar efetivamente de segurança, preciso falar em gestão de sociedade pela perspectiva de pertencimento das pessoas. Preciso entender o pertencimento desse grupo. Um jovem que vê seu amigo estudando, alimentando sua família, sonhando, comprando seus bens através do seu trabalho, sem precisar ser cooptado pelo tráfico, ele não vai querer uma arma, mas um computador, um carro, um escritório ou um empreendimento que ele coloca. Temos que rever todas as políticas do país. Trazer as pessoas para essa discussão. O governo tem que tomar decisões em cima de fatos, dados e estudos científicos. Ciro não é favor ao acesso indiscriminado às armas, mas fiz questão, pelo meu conhecimento em assistência social, de sair dessa visão simplista e fortalecer o indivíduo e perceber que, pelo trabalho e educação, ele terá acesso a tudo que precisa. Tenho que respeitar os agentes de combate aos crimes, polícia bem treinada e capacitada. Uma polícia comunitária efetiva e que não tema, que tenha respeito ao outro. Quando isso acontece a sociedade amadurece. O governante tem responsabilidade de fazer as diretrizes e tomar para si a autoria e temos autoridade moral para isso. Temos que gerir a sociedade. Todas as forças precisam estar fortes, mas precisamos entender a complexidade na sociedade. De imediato a segurança melhora.
Não há nada que indique que os partidos do Centrão terão menor representatividade na próxima gestão. Em um governo do Ciro, considerando essa ampla maioria destas siglas que hoje dão sustentação a Bolsonaro, como compor com este grupo para ter condições de avançar com essas propostas? A primeira parte nós estamos fazendo, que é a eleição programática. Conversar com as pessoas sobre nossas propostas, para que possam ir junto com a gente defender nosso projeto. Entender esse país, o Pacto Federativo e refunda-lo, se necessário. Entender o endividamento dos Estados. Os Estados e municípios precisam entender a força que possuem com seus representantes no Senado e na Câmara. Nas votações eles respondem ao país, mas tem sua base. Eles precisam ter um cuidado com aquela cidade em que eles tiveram mais votos. Nossa ideia é conversar, nesse novo pacto, com os governadores e prefeitos e entender o ganho para o país e, junto com eles, ajudar a conquistar votos no Senado e na Câmara. Não vamos fazer nenhuma troca. Temos valores inegociáveis. Quando se tem prefeito e governo próximo do deputado, do senador, o primeiro passo foi dado. Não vamos apresentar surpresa. Se o governante não sabe o que fazer e cada hora tem uma ideia diferente, você acaba sujeito a discussões periféricas acessórias e não foca no principal, que é cuidar do povo. O melhor para o povo é um país de oportunidade e de igualdade. Eu e Ciro estamos preparados. Temos coerência e firmeza. Saberemos fazer esse Pacto Federativo.
Nas últimas semanas, Ciro tem feito ataques duros a Lula. As declarações, inclusive, foram compartilhadas por ministros do governo Bolsonaro, o que, segundo nossa apuração, causou um incômodo no PDT. A senhora acha que ele se excedeu no tom? Ciro apenas falou verdade. Ele tem dito situações que foram vistas, inclusive em debate. Teve candidato que parou de responder no meio da frase. O que ele disse ao PT foi: “Eu pedi impeachment do atual presidente, entrei com ações no Supremo. Tenho falas com críticas contundentes contra o atual governo. Por que vocês na usam esse vídeo? Quem teve o interesse em não combater o atual governo?”. Posso garantir que Ciro não faltou com a verdade. Se as pessoas pegam um vídeo com recorte ou sem recorte e utilizam, a responsabilidade delas. As críticas feitas pelo Ciro foram feitas no debate. Se na democracia se pega o que foi falado de modo verdadeiro e se utiliza recorte, a responsabilidade é de quem faz. Se o ex-presidente [Lula] não utiliza, por que será? Ciro falou a verdade. Se foi usado depois no recorte, pode parecer excesso. Não tira do contexto aquilo que aconteceu. É o jeito dele falar. O que importa é falar a verdade. Se alguém sentir que não foi da maneira da adequada, que questione. Mas não use de maneira inadequada. Ciro é verdadeiro e apaixonado pelo Brasil.
Então, a senhora não vê excessos? Ciro é um indignado. Não aceita ver uma criança passando fome, que não sabe ler, escrever e que está sem a casa dela, porque alguém está transferindo esse dinheiro inadequadamente. Não aceita corrupção, os malfeitos. Isso foi um vídeo que o outro lado colocou. Por que o grupo do ex-presidente não utiliza a frase que o Ciro fez com relação ao atual presidente? Seria pelo fato de não terem assinado os manifestos contra ao atual presidente? Não sou eu que tenho que defender ele. São as pessoas erradas que precisam se defender. Vão punir uma pessoa honesta e verdadeira por ser assim? No Brasil, ser honesto e falar o que pensa, com respeito, é errado? Ele foi criticado por apertar as mãos de todos os candidatos no debate. É pegar a foto de um e utilizar. Isso [a campanha pelo voto útil] não é violência política e um enviesamento da informação? É isso que está acontecendo.