A pouco mais de cinco meses do primeiro turno das eleições, os partidos da autointitulada terceira via trabalham para evitar o esfacelamento do chamado “centro democrático”, composto inicialmente por PSDB, MDB, Cidadania e União Brasil, siglas que buscam viabilizar uma candidatura competitiva para se contrapor à polarização entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PL). Publicamente, os dirigentes destes partidos mantêm o otimismo e afirmam que o candidato escolhido para representar o grupo nas urnas, em outubro, será apresentado no dia 18 de maio. Um evento realizado na tarde desta quarta-feira, 28, em São Paulo, porém, joga luz sobre o clima nos bastidores das tratativas.
O União Brasil, que surgiu da fusão entre DEM e PSL, não enviou nenhum representante ao encontro dos caciques da terceira via, promovido pelo movimento “Derrubando Muros” para tratar da “chapa unificadora do centro democrático”. A ausência do partido dá o tom dos novos planos da legenda, que pretende abandonar o barco das articulações para lançar candidatura própria. À Jovem Pan, o presidente nacional do Cidadania, Roberto Freire, afirmou que a sigla comandada por Luciano Bivar tem dado “sinalizações” de que deixará o bloco. Em seu discurso, Freire foi além e deu uma estocada no União: “Essa reunião, quando foi pensada, vivíamos uma outra realidade entre nós. Tudo que a gente fizer corre o risco de, daqui uma semana, ser diferente. Na última reunião que nos tivemos, tinha um representante de um outro partido, o União Brasil. Tudo indica que eles estão indicando para uma quarta via”. Quadros das siglas que participam das negociações disseram à reportagem que o martelo deve ser batido na quarta-feira, 4.
Mas este não é o único fator que indica que a terceira via enfrenta problemas internos. O presidente nacional do PSDB, Bruno Araújo, não compareceu ao evento desta quinta. O tucanato foi representado pelo ex-ministro Pimenta da Veiga. Em fevereiro deste ano, Veiga foi o anfitrião de um jantar que reuniu entusiastas da candidatura do ex-governador do Rio Grande do Sul Eduardo Leite e críticos da postulação do ex-governador de São Paulo João Doria, que sequer foi citado pelo tucano em seu discurso no encontro do Derrubando Muros desta quarta. Quem compareceu à agenda foi o presidente nacional do MDB, Baleia Rossi. O cenário dentro da sigla, porém, também não é dos melhores. Lançada como pré-candidata da sigla, a senadora Simone Tebet (MDB), de atuação destacada na CPI da Covid-19, é alvo de ataques especulativos de outros integrantes da legenda.
Caciques emedebistas, como o senador Renan Calheiros (AL) e o ex-presidente do Senado Eunício Oliveira (CE), defendem uma aliança com Lula já no primeiro turno. Há, também, parlamentares que apoiam o presidente Jair Bolsonaro – o líder do governo no Congresso, senador Eduardo Gomes (TO), é filiado ao MDB. Como Tebet oscila entre 1% e 3% nas pesquisas de intenção de voto, há quem entenda que Rossi banca a postulação da senadora para reeditar o “efeito Meirelles” e evitar que a sigla declare apoio a um dos candidatos já no primeiro turno. Em 2018, Henrique Meirelles concorreu à Presidência da República, mas ficou na sétima colocação, com apenas 1,2% dos votos válidos. Sem nenhum nome forte e sem consenso para fortalecer um único representante, o “centro-democrático” abre caminho para a polarização entre Lula e Bolsonaro.