Em 4 de julho, os britânicos elegem o novo primeiro-ministro. O quarto em menos de dois anos, algo tradicionalmente incomum no Reino Unido, pois, historicamente, os líderes passam décadas no poder, como Margaret Thatcher e Tony Blair, e caso não fiquem décadas, pelo menos passam os cinco anos. Uma das questões centrais dessas eleições britânicas é que elas acontecem em um cenário totalmente diferente que coloca em risco até mesmo o futuro do Reino Unido. O país não está mais no Brexit, a Rainha Elizabeth II morreu e nações pertencentes ao Reino, como Escócia e Irlanda do Norte, querem se desligar. Referendos separatistas já foram até colocados em pauta nos dois países. “Você teve quatro primeiros-ministros que os três últimos não participaram de eleições, e que uma promessa de campanha do primeiro-ministro Rishi Sunak era que isso teria que ser resolvido na mão do povo”, fala Igor Lucena, economista e doutor em relações internacionais pela Universidade de Lisboa. Contudo, apesar da convocação das eleições ter sido a “melhor saída” neste momento, essas trocas no governo britânico criam um “cria um aspecto de deslegitimação, porque a pessoa que lidera o partido não foi a que a população escolheu nas eleições gerais”.
Para Vinícius Vieira, professor de relações internacionais da Fundação Armando Alvares Penteado (Faap), essa estratégia de Sunik foi uma forma que ele encontrou para que o Partido Conservador não perca de maneira tão feia e os Trabalhistas ganham de forma esmagadora. “Sunac parece ali querer fazer uma jogada para mitigar as perdas dos conservadores, pesquisas apontam para uma vitória, uma maioria trabalhista, a grande questão é por quanto será essa maioria?”. O Partico Conservador, no poder há 14 anos, está próximos a se despedir, porque, como mostram as pesquisas, o Partido Trabalhista aparece com uma boa margem de vantagem à frente. São 45% das intenções de votos para o esquerdista Keir Starmer, de 61 anos, contra 20% do primeiro-ministro Rishi Sunak. A volta ao poder da esquerda seria algo que não acontece desde 2010. Para tentar reverter o cenário, os conservadores anunciaram um palco para corta as cotas de vistos de trabalho e familiares concedidos anualmente, com o objetivo de reduzir a imigração, um tema-chave da campanha para as eleições de julho. Segundo a estatística oficial, no ano fiscal encerrado em março de 2024 foram concedidos mais de 300 mil vistos de trabalho, mais do dobro do que quatro anos antes.
Nesta semana, os dois se enfrentaram em um primeiro debate. O encontro aconteceu em Salford, norte de Inglaterra. O conservador Sunak, de 44 anos, disse que tem “um plano claro para um futuro mais seguro”, enquanto Starmer, de 61, disse querer o apoio dos eleitores para mudar o país. Uma pesquisa do instituto Yougov apontou Sunak como vencedor do debate para 51% dos entrevistados, enquanto Starmer ficou com 49%. Para Igor Lucena, essas eleições vão ser “um referendo sobre as decisões que o Partido Conservador tomou em relação ao novo relacionamento do Reino Unido com a União Europeia”. Desde a saída do Brexit, em janeiro de 2020, os resultados que tinham sido prometidos, não aconteceram. Por outro lado, existe um gap gigante entre o que se falava antes da aprovação e o que tem sido registrado agora. “Há uma sensação de empobrecimento da sociedade”, fala o professor Vinícius Vieira. Sunak conseguiu melhorar a inflação, mas isso não é o suficiente para conseguir manter os Conservadores no poder. “Há um grande questionamento na sociedade inglesa sobre o Brexit, grande maioria da sociedade não aprova os resultados do Brexit, que foi sim aprovado e chancelado pelo Partido Conservador”, fala Lucena.
“O fato do Brexit ter acontecido e a própria população pressionado para que o Reino Unido entregasse algo que ele nunca iria entregar, fez com que caíssem vários primeiros-ministros”, acrescenta o especialista, que também reforça que o que vemos hoje no Reino Unido é “a importância da estabilidade do premiê, ela contribui diretamente para a estabilidade e para o crescimento do país”. Vinícius Viera destaca que, antes da saída do Brexit, se tinha uma pauta que ‘dominava’ que era a oposição à migração, contudo, a mudança na relação com a União Europeia fez com que os questionamentos reduzissem, então o que sobrou para decidir a disputa política é a agenda econômica. “Do ponto de vista econômico, o Reino Unido está estagnado há muito tempo. Inclusive, é importante dizer, para não atribuir todos os males ao Brexit, já havia dado ali sinais de decadência econômica já sobre o governo de David Cameron”, fala o professor.
Um ponto que Lucena destaca em relação às eleições do Reino Unido é que um dos grandes problemas é o próprio Reino Unido, porque os países pertencentes a ele querem se desvincular. “Irlanda do Norte que fazer, nos próximos cinco anos, um referendo para provocar a reunificação das Irlandas. Se isso acontecer, não seria em prol do Reino Unido, obviamente, seria em prol da República da Irlanda”, fala o professor, que também lembra que a Escócia também está passando por um momento extremamente difícil de readaptação. “O que nós também assistimos e vamos assistir é que existe uma crise de unidade nacional do Reino Unido e que se agrava com a perda da rainha da Inglaterra”, acrescenta. Rainha Elizabeth II morreu em 8 de setembro de 2022.
Charles III, seu primogênito, assumiu o trono, contudo o novo rei não é popular entre os súditos e a monarquia vem perdendo força. “A rainha Elizabeth era talvez um dos elementos principais que uniam os quatro países: Irlanda, Inglaterra, País de Gales e Escócia”, fala. Rei Charles II ainda não conseguiu traçar e mostrar essa unidade nacional. “Quando você tem uma desunião política e uma desunião do símbolo maior do país, isso vai ser, talvez, um dos pontos de debate quais vão ser os planos do partido para tentar reunificar politicamente do ponto de vista de oportunidades e trabalho o Reino Unido”, caso isso não aconteça, o professor diz que é um grande risco porque, pelo menos na próxima década, o Reino Unido pode não ser mais tão unido assim.
Fonte: jovempan
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