22 de Novembro de 2024

Entidades atuam no combate ao racismo e na inserção de negros em órgãos públicos e privados


SAULO ANGELO/FUTURA PRESS/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO

O poema “Navio Negreiro” de Castro Alves já gritava: “Senhor Deus dos desgraçados! Dizei-me vós, Senhor Deus! Se é loucura, se é verdade, tanto horror perante os céus?!”. De lá, para cá, houve mudanças em degraus. Primeiro o fim do tráfico de escravos, depois a Lei do Ventre Livre, depois o fim da escravidão. Restou o subproduto destes tempos narrados pelo poeta. O racismo e a discriminação social. Essa é uma luta que atravessa séculos e que é mostrada no dia a dia do brasileiros e nas lágrimas de quem é atingido por ataques silenciosos que podem sair da penumbra e serem corrigidos nas próximas gerações. Em entrevista à Jovem Pan News, Silmara Pereira, que é secretária-geral da Associação Nacional da Advocacia Negra (Anan), contou que a instituição agrega profissionais das mais diversas áreas do conhecimento com um único propósito, o de combater o racismo de modo prático: “A parte inicial é as pessoas se entenderem como negros. Infelizmente, no Brasil, desde o momento que nós tivemos a Proclamação da República é que nós tivemos toda a criação de leis com o apagamento da nossa história”.

“Houve queimadas de documentos, a proibição de que nós estudássemos, a proibição de que nós adquiríssemos terras e tudo isso foi apagado. A gente não sabe da onde que a gente veio. A gente não sabe onde estão nossos familiares, de onde é a nossa origem. Então, a gente estudar e ter esse conhecimento de que nós fomos sequestrados e que nós perdemos parte da nossa história faz muita diferença na educação dos nossos filhos, sejam eles brancos ou negros, e faz com que nós pertençamos a uma história, que nós tenhamos uma ancestralidade”, declarou . A secretária-geral da Anan também explicou que a entidade reúne advogados de diferentes estados do país e que foi criada para incentivar a participação de operadores do direito negros em órgãos públicos e privados: “Muitas vezes as práticas discriminantes acontecem nas políticas empresariais. É um trabalho muito grande, tanto na educação fundamental, média e de nível superior, quanto na questão de você trabalhar com os servidores públicos e empresas privadas”.

O Brasil é um país idealizado branco, mas com uma realidade negra. Hoje, os negros representam mais da metade da população brasileira, mas o número está longe das lideranças, cargos de comando ou profissões de ponta. Mas aos poucos empresas com novas visões apostam no restabelecimento do equilíbrio. A Central Única das Favelas (Cufa) é uma organização não governamental que dá protagonismo ao negro. Fundada em 1999, por jovens negros da favela Cidade de Deus, no Rio de Janeiro, hoje está presente em todos os Estados brasileiros e até em outros países. Preto Zezé é presidente nacional da Cufa, fundador do Laboratório de Inovação Social e membro da Frente Nacional Antirracista e contou como é a atuação da ONG: “Acho que a Cufa contribui em três frentes importantes. A primeira delas é formando lideranças nesses processos e dentro desses territórios. A segunda é enfrentando o que o racismo fez de mais perverso para essas pessoas, que foi criminalizar o ambiente onde as pessoas das favelas vivem devido a esse olhar mais racista. Começam a olhar uma favela ou como medo, ou como ambiente de carência, ou como lugar de perigo que a polícia tem que vigiar. E nunca como lugar de investimento, inovação, resposta e solução. E, por último, elaborar uma agenda de interesses que possa pautar o setor privado e o setor público.

“Essa é a nossa forma de enfrentar e colaborar para que o racismo, mesmo que ele exista, ele não tenha tanto impacto nas nossas vidas porque a gente vai estar mais preparado para enfrentá-lo e vai ter mais mecanismos para poder perceber e neutralizá-lo. E vamos trabalhar também em um movimento de mudança de valores, que é o que nós acreditamos, para que ninguém veja que porque nós somos diferentes vamos transformar nossa diferença em desigualdade, como acontece hoje”, declarou o presidente nacional da Cufa. Mas Preto Zezé alerta que, mesmo com a atuação de ONGs e grupos contra o racismo, o Estado deve tomar responsabilidade na luta contra o racismo: “O Estado tem que cumprir suas funções porque ele arrecada para isso, ele recolhe tributos da sociedade para isso e ele tem que devolver, né? Penso que as ações nossas inspiram, pauta, e chamam atenção, mas o Estado é que tem a sua escala e tem a sua responsabilidade constitucional de atender e garantir os direitos da população”.

Nas eleições de 2022, o número de candidatos negros superou o de brancos. Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), os negros representaram 50,27% do total de candidatos a algum cargo eletivo. Em 2018, quando também houve eleição geral, as candidaturas negras foram 46,4% do total. Apesar disso, os dados mostram que ainda há muito a se fazer para alcançar a equidade racial também entre os representantes do povo. O dia 20 de novembro é o dia da Consciência Negra, mas a consciência precisa ser geral.


Fonte: jovempan

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