28 de Setembro de 2024

" Eu nunca perdi um paciente"


Aos 92 anos, dos quais quase 60 dedicados à medicina, o anestesiologista bauruense Gilberto Nunes da Cunha orgulha-se de um verdadeiro feito profissional. Com 35 mil anestesias realizadas na carreira, afirma nunca ter perdido um paciente sequer. "Passei aperto, susto, levei paciente para a recuperação, mas nunca perdi ninguém", afirma ele, que trabalhou como anestesista durante 23 anos na Santa Casa de Bauru (hoje Hospital de Base), a maior parte também como diretor do centro cirúrgico. "Tem que dar uma anestesia no paciente para que o cirurgião possa operar sem se preocupar. E não é só fazer o camarada dormir, ele não pode sentir dor", explica sobre seu ofício.

Pela quantidade de procedimentos realizados por ele, o feito pode ser considerado raro. Em um estudo feito a partir de 55 mil anestesias realizadas entre 2005 e 2012 no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Unesp de Botucatu, o pesquisador Wangles Pignaton em sua tese de doutorado encontrou uma incidência de 16 óbitos a cada dez mil anestesias.

Em outros momentos da carreira, Gilberto trabalhou em hospitais, institutos e clínicas particulares. E boa parte desse sucesso ele atribui à formação tanto na Escola Paulista de Medicina (EPM), em 1955, quanto aos dois anos de residência no General Hospital of Madison, em Wisconsin, Estados Unidos, em 1956 e 1957. Foi lá, inclusive, que ele participou da primeira cirurgia cardíaca "a céu aberto" daquele estado norte-americano.

A expressão "a céu aberto" é usada pelos médicos quando se opera o coração por dentro. Para isso é preciso fazê-lo parar de bater mantendo o paciente vivo, utilizando uma máquina de circulação extracorpórea (CEC), substituindo as funções do coração e do pulmão.

Gilberto foi casado durante 50 anos com Nair Mattos da Cunha, falecida em 2008. Tiveram três filhos: Gilberto Filho, Carlos (em memória) e Ana Cristina. Ele tem cinco netos e uma bisneta, a xodó Margot, de cinco meses, nascida na França e que veio conhecê-lo neste Natal. A seguir, você confere os principais trechos da entrevista que ele concedeu ao JC.

Jornal da Cidade - Por que o senhor foi fazer residência em outro país?

Gilberto Nunes da Cunha - Porque quem começou a me ensinar anestesia em São Paulo foi Carlos Parsloe, amigo de hospital. Ele tinha feito residência nos Estados Unidos porque era filho do cônsul americano em Santos que casou com uma brasileira. O Carlos começou a me ensinar e fui para lá em 1956.

JC - Nos Estados Unidos o senhor participou de um procedimento que era inovador.

Gilberto - Foi a primeira cirurgia cardíaca (a céu aberto) nesse Estado em que eu estava, Wisconsin. Trabalhamos em três anestesistas e correu tudo bem. Foi uma novidade, me deixou muito satisfeito.

JC - Depois da residência decidiu voltar para Bauru?

Gilberto - Voltei e fui trabalhar na Santa Casa (hoje Hospital de Base). Comecei no dia primeiro de janeiro de 1958 e já fiz o primeiro procedimento. O ortopedista de plantão me chamou para anestesiar um garoto de 11 anos para reduzir uma fratura. Depois, ele virou meu amigo. Trabalhei 23 anos na Santa Casa, fiz 35 mil anestesias. Ia para hospital de manhã, voltava para almoçar, ficava até anoitecer. Fazia plantões direto. Claro que eu tinha quatro auxiliares. Fui diretor do centro cirúrgico até me aposentar. Chegava a fazer 110 anestesias por mês. Nunca perdi um paciente. Passei aperto, levei susto, mas nunca perdi um paciente.

JC - A quê o senhor deve esse sucesso?

Gilberto - Aprendi em um local onde ensinavam muito bem. E o anestesista precisa estudar, principalmente farmacologia. Tem que conhecer muito para se tornar um profissional competente. Estudei a vida inteira. Médico tem que se atualizar senão vira um fracasso.

JC - Ao longo de sua carreira, a anestesia mudou muito?

Gilberto - Sim, bastante. Os medicamentos foram modernizando e ficando cada vez mais seguros.

JC - Algum caso marcou?

Gilberto - Teve um logo que comecei. Fiz anestesia em um menino que operou da amídala, mas ele começou a ter hemorragia em casa. Trouxemos de volta para o hospital e ele precisava de uma transfusão de sangue, para ajudar na coagulação. Quem doou fui eu. Ele era "O negativo", um grupo sanguíneo raro, e, por coincidência, eu era do mesmo grupo. Não ia ser fácil achar doador em Bauru, por isso fizemos na hora. Sentei, chamei a enfermeira, tiramos uma bolsa de sangue. A transfusão ajudou a parar o sangramento em pouco tempo.

JC - Depois de toda essa trajetória, qual sua avaliação?

Gilberto - Minha vida profissional foi uma vitória. Porque fazer 35 mil até a idade que eu fiz e não perder um paciente sequer é uma vitória. E os principais fatores foram competência, preparo, mas também sorte. Um médico pode ter azar da pessoa ter uma parada cardíaca e isso nunca aconteceu comigo.



Fonte: JC Net

Fonte: jcnet

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